por Raquel Rebelo, CEO da IFE by Abilways
A individualização, personalização ou customização, como lhe preferirmos chamar, é claramente uma realidade que ganhou corpo na era digital, mas não é de todo uma questão nova.
Nas empresas como nas escolas há muito que procuramos soluções para respeitar os ritmos e necessidades individuais nos processos de aprendizagem.
Razão vs Emoção – como é que os novos modelos de aprendizagem ligam estes dois hemisférios?
Partilho um episódio recente que vivi e que responde claramente a esta questão. Durante uma learning expedition realizada no âmbito do processo de construção da visão 2025 do Grupo Abilways, do qual a IFE faz parte, com o objetivo de aprendermos mais sobre o espírito startup, as novas formas de trabalhar, os novos modelos de negócio e o management do futuro, a que demos o nome de Startup Tour, eu e alguns colegas da IFE, tivemos a oportunidade de visitar um colégio fantástico na zona de Cascais, chamado “Os Aprendizes”.
É uma escola onde se respeita a individualidade de cada criança no seu percurso de aprendizagem e onde se obtêm excelentes resultados… e onde ainda por cima as crianças são felizes!!!
Esta visita foi de facto inspiradora. Nesta escola, onde não se aprende com manuais, onde as crianças trabalham em equipa e se fomenta a colaboração, onde se aceita o erro, onde se aprende matemática, estudo do meio e português “com o corpo”.
E o que é que isto quer dizer? Quer dizer isso mesmo que a estratégia da escola é desformatar o processo de aprendizagem, deslocalizando o foco do cérebro para o corpo. Ou seja, da razão para a emoção. Quando sentimos, ou experimentamos, percebemos o propósito e a aprendizagem ganha consistência.
Mas então, como é que estas crianças aprendem matemática com o corpo?
É difícil à partida imaginar, mas tivemos a oportunidade de assistir a uma pequena parte de uma aula do primeiro ciclo, onde a professora estava a ensinar as centenas. Quando entrámos na sala, algumas das crianças estavam agrupadas em pequenos “comboios” enquanto outras, sentadas e algumas de pé em outros pontos da sala, tentavam adivinhar o número que elas estavam a representar. Quando perguntámos o que estavam a fazer, disseram-nos: estamos a aprender as centenas… Eu sou a unidade! Eu sou a dezena! Eu sou a centena! Diziam bastante divertidos…
É este foco no fazer, na experimentação, com emoção e de uma forma divertida e envolvente que pode potenciar e acelerar os processos de aprendizagem.
Num ecossistema digital, que é claramente aquele que vivemos os dados são the next big thing. Como contribuem para a personalização da formação?
Na era digital, onde quem tem acesso aos dados é rei… é possível potenciar ainda mais a customização e a personalização dos percursos de formação.
É difícil imaginar o futuro da formação e da individualização dos percursos de aprendizagem sem pensar nos dados.
Na era do on-demand e do ATAWADAC, onde as pessoas querem ter cada vez maior autonomia na decisão do quê, de quando e como querem comprar, consumir, fazer, aprender… Onde o acesso ao conhecimento está facilitado, mas ao mesmo tempo se torna obsoleto muito rapidamente. E como bem sabemos adquirir conhecimento é bem diferente da aprendizagem…
Onde a necessidade de aprender se torna contínua…on-time! Torna-se imperativo ter acesso a dados que nos permitam conhecer em detalhe o perfil e as necessidades específicas do learner (as suas preferências, interações, background profissional, formações realizadas ao longo do percurso profissional, formação de base, interesses, etc.) para recomendar um percurso de aprendizagem relevante e on-time.
Esta ‘guerra’ do acesso aos dados chegou à formação e veio, muito provavelmente, para ficar.
Foi pelo menos isso que sentimos quando em Janeiro tivemos a oportunidade de visitar, no âmbito de uma expedição a Sillicon Valley, alguns dos grandes atores americanos da formação, como a Universidade de Stanford, o Linkedin ou a Coursera, para quem os dados são considerados a “the next big thing”, o próximo grande passo da formação.
Um dos melhores exemplos é talvez o Linkedin, visto que dispõe de informações massivas sobre o percurso profissional, as competências, os interesses, e as formações profissionais de mais de 460 milhões de utilizadores registados a nível mundial (e cerca de 2 milhões em Portugal). Não sei se todos sabem, mas no outono de 2016, foi lançado o LinkedIn Learning, um portal global de e-learning B2B2C, com o objetivo de se tornar um fornecedor mundial de e-learning. Há até quem já se refira ao Linkedin como a “Amazon da formação”…
Assustador!!! Mas ao mesmo tempo desafiante e inspirador!
Não podemos deixar de concordar que só existem vantagens em conseguir oferecer uma formação adaptada ao desenvolvimento de uma determinada competência em falta num perfil de um determinado utilizador que existe na maioria dos perfis semelhantes. Os dados fazem, sem dúvida, parte da equação da aprendizagem do futuro.
Falta perceber como é que isto vai ser aceite pelos utilizadores e até que ponto estaremos a respeitar a vida privada dos utilizadores…
O digital não se resume aos dados… O digital e sobretudo o mobile, colocou à nossa disposição uma série de plataformas tecnológicas que nos permitem combinar uma série de diferentes modalidades pedagógicas para responder de uma forma muito mais precisa às necessidades do learner atual:
- Possibilidade de escolha;
- Autonomia de acesso: ATAWADAC;
- Resposta às necessidades do momento;
- Interação imediata.
Posso dar exemplos de algumas combinações possíveis:
- Vídeo on demand – que vídeos curtos, integrados, ou não, em percursos de aprendizagem, dinâmicos e interativos, que integrem jogos e desafios que estimulem o envolvimento e funcionem como micro momentos de aprendizagem para o chamado micro-learning;
- A integração de plataformas colaborativas nas sessões de treino presencial para desafiar, estimular, envolver e facilitar a aprendizagem;
- O uso de tutoriais em vídeo para facilitar o saber fazer;
- A introdução da realidade virtual para tornar as simulações mais reais e induzir determinada emoção;
- Acesso a live streaming de intervenções de especialistas em determinada matéria;
- O recurso à biblioteca de conteúdos do Youtube ou de plataformas de curadoria de conteúdos;
- etc. etc.
Tudo isto é possível e traduz resultados fantásticos
A tecnologia potencia a experiência de aprendizagem?
A tecnologia é apenas um meio que ao ser integrada no mix pedagógico certo potencia e acelera o ritmo da aprendizagem.
A tecnologia vem complementar de forma brilhante os métodos mais tradicionais da aprendizagem.
A integração da tecnologia vai-nos permitir criar uma experiência de aprendizagem a 360º, plural e verdadeiramente blended que combina várias plataformas, formatos, conteúdos, pedagogias, etc.
E os formadores estão a responder a estas novas experiências de aprendizagem?
É necessário “transformar” os formadores.
Desafiando-os a adquirir novas competências e a integrar novos formatos pedagógicos nos processos de aprendizagem, a desenvolver competências digitais, utilizando uma abordagem prática e experiencial e acima de tudo colocando o foco no learner e desfocando-se do seu saber e de si próprios.
O formador deve pesquisar, selecionar, triar, curar e partilhar as pesquisas efetuadas com os learners e propor/disponibilizar conteúdos, facilitando e guiando o processo de aprendizagem que é e sempre será individual.
Keep it simple! É assim que deve ser?
Na minha opinião temos de descomplicar o processo.
Porquê esperar para ter uma turma de 12 pessoas quando há 1 ou 2 colaboradores com uma necessidade urgente de desenvolver determinada competência?
Ou porquê limitar um grupo a 12 quando temos 20 ou 30 pessoas com a mesma necessidade e a mesma urgência?
Quem disse que uma sessão presencial não pode reunir 200 pessoas de uma vez?
Misturar pessoas, sim… Porquê insistir em constituir grupos homogéneos quando as equipas são heterogéneas e as competências múltiplas e diversificadas?
Porque não potenciar as diferenças individuais para desenvolver a inteligência coletiva criando equipas de projeto multidisciplinares onde as diferenças se complementam e acrescentam valor?
Então e os espaços, devem ser transformados também?
Sim, devemos transformar os espaços. A transformação dos locais de trabalho em locais que fomentam a partilha e estimulam a aprendizagem entre todos, que misturem gerações, funções, hierarquias, espaços de trabalho com espaços de lazer e de coworking. Espaços transversais que fomentem a colaboração e aprendizagem entre pares.
Tudo isto é uma realidade. Existe! Mais ou menos testado, tudo isto pode ser feito para potenciar a aprendizagem.