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Uma chamada à realidade para todos aqueles gestores que achavam que os trabalhadores apenas eram produtivos quando controlados

Uma chamada à realidade

Uma chamada à realidade para todos aqueles gestores que achavam que os trabalhadores apenas eram produtivos quando controlados

Paulo Castanheira, Diretor do Serviço de Gestão de Recursos Humanos e do Desenvolvimento Profissional, CHMA – Centro Hospitalar do Médio Ave

O teletrabalho, veio para ficar. No entanto, é uma realidade que não pode ser experienciada por todos os colaboradores. No seu caso, tem certamente colaboradores para quem esta opção é aplicável e outros que não, como lidar com as expectativas de uns e outros?
Efetivamente, numa realidade hospitalar, a esmagadora maioria das funções não pode ser desempenhada em regime de teletrabalho. Existem, porém, algumas funções que podem ser executadas em teletrabalho, o que torna a gestão desta questão ainda mais complexa.
O CHMA tem por princípio facilitar a conciliação da vida profissional com a vida pessoal e isso não foi diferente no que ao teletrabalho se refere, contudo temos também que avaliar a questão de um prisma global a nível organizacional. Por exemplo, a generalidade das funções da gestão de recursos humanos pode ser desempenhada remotamente. Contudo, se mantemos a grande maioria dos profissionais em presença física, não faz sentido que estes não disponham de um atendimento presencial do serviço de gestão de recursos humanos, como sempre tiveram. Ou seja, é importante que se verifique um equilíbrio e, aos profissionais a quem não pode ser concedido o regime de teletrabalho, seja garantida pelo menos uma realidade organizacional idêntica à que estes estão familiarizados, caso contrário vai gerar (ou aumentar) um sentido de injustiça e “penalização” face aos trabalhadores que podem exercer a sua atividade em teletrabalho.
Contudo, esta questão não tem sido um problema no CHMA, pois a generalidade dos profissionais está ciente das responsabilidades inerentes à sua função, tanto nos serviços assistenciais como nos serviços de suporte, em alinhamento com o propósito e a missão da própria organização.

Minimizar as diferenças que existem entre o teletrabalho e o trabalho presencial, fazendo com que os trabalhadores se sintam mais motivados a “abandonar” o conforto do seu lar para ir trabalhar

Os colaboradores a quem o teletrabalho não é aplicável, deverão ser, de alguma forma, “compensados”?
Na minha opinião, esses trabalhadores devem efetivamente ser recompensados, mas não monetariamente. Eu defendo que essa compensação deve ocorrer através de melhores condições no próprio local de trabalho, como por exemplo: melhoramento dos locais de trabalho, nomeadamente das salas de pausa/ convívio/ refeições, para que os profissionais possam usufruir de pausas com melhor qualidade, fazer refeições mais próximas do que as que fazem habitualmente em casa, e não a habitual e repetitiva comida de restaurante/ cantina; possibilitar flexibilidade de horários (sempre que possível), de forma a minimizar o “impacto” de ter que ir fisicamente trabalhar para o local de emprego; dress codes menos formais (sempre que possível), para que se sintam mais confortáveis; e outras iniciativas que aumentem a qualidade de vida dos trabalhador durante a jornada de trabalho, como por exemplo oferecer massagens aos trabalhadores no local de trabalho durante alguns minutos do seu dia ou outras iniciativas que proporcionem o bem estar dos profissionais.
Desta forma, as empresas estarão não só a “recompensar” os trabalhadores que têm que exercer a sua atividade presencialmente, mas também a minimizar as diferenças que existem entre o teletrabalho e o trabalho presencial, fazendo com que os trabalhadores se sintam mais motivados a “abandonar” o conforto do seu lar para ir trabalhar.

Quando exercemos as funções em teletrabalho, por mais meetings e calls que se realizem, é natural que a ligação aos restantes membros da equipa se vá diluindo

No CHMA há equipas de trabalho híbridas? Como é feita a gestão destas equipas, quais os maiores desafios?
Sim, desde o início da pandemia que temos algumas equipas a trabalhar em regime híbrido.
Julgo que a maior dificuldade será mesmo a preservação da ligação à equipa. Quando exercemos as funções em teletrabalho, por mais meetings e calls que se realizem, é natural que a ligação aos restantes membros da equipa se vá diluindo. Assim, é fundamental um acompanhamento próximo por parte dos gestores de cada equipa, de forma a acompanhar e estimular este trabalho em equipa, garantindo o alinhamento de todos os elementos das equipas.
O outro grande desafio passa pela questão da preservação da cultura organizacional e da sua assimilação por parte de todas as pessoas da organização. Para quem já trabalha na instituição há muito tempo, talvez seja mais fácil conseguir que a sua assimilação não se esvaneça. Contudo, para alguém que entra de novo para a instituição e inicia funções maioritariamente num regime de teletrabalho, esta aculturação pode tornar-se mais difícil ou ocorrer de forma enviesada. Neste ponto torna-se ainda mais importante o acompanhamento próximo, de preferência por um elemento sénior, durante todo o período de integração/ socialização, que em princípio poderá estender-se por um período de tempo superior ao que seria normal num regime de presença física.

Aqueles que prevaricam em regime de teletrabalho são os mesmos que o fazem em trabalho presencial

O ambiente de trabalho mudou e há ambientes que não voltarão a ser iguais. O que destaca como tendo sido uma “evolução positiva” e que aprendizagem retirar?
Na minha opinião, a grande mudança foi que a pandemia veio obrigar algumas empresas, nomeadamente os seus gestores, a repensarem as realidades das suas organizações.
Desde logo, e aqui não me estou a referir ao CHMA mas sim a várias empresas com que fui contatando ao longo dos anos, muitos “pseudo líderes” tinham sérias dificuldades em confiar nas suas equipas. E de repente o país entrou em confinamento, com a maioria dos profissionais a terem de trabalhar a partir de casa, sem o controlo in loko das chefias diretas, e a produtividade na generalidade das situações foi excelente! E isso foi uma chamada à realidade para todos aqueles gestores que achavam que os trabalhadores apenas eram produtivos quando controlados constantemente. Há ainda alguns gestores mais conservadores que continuam a não querer acreditar que os trabalhadores são, por norma, responsáveis, mas muitos deles não têm outra alternativa que não, renderem-se às evidências. Claro que não estou com isto a dizer que todos são excelentes trabalhadores e que todos demonstram uma enorme responsabilidade, mas aqueles que prevaricam em regime de teletrabalho são os mesmos que o fazem em trabalho presencial. E os gestores, independentemente do seu nível na estrutura organizacional, têm que perceber que quanto mais autonomia atribuímos a um profissional, mais comprometimento e responsabilidade obtemos em retorno.
Outro aspeto positivo foi termos todos sido obrigados a repensar as nossas rotinas e formas de trabalhar. Na generalidade das situações, os processos de trabalho sofreram alterações. Descomplicaram-se procedimentos e acabamos todos por perceber que muitas das nossas práticas diárias, até em pequenos pormenores, se calhar já não faziam sentido, melhorando e simplificando as nossas formas de trabalhar, o que se está a revelar muito positivo para as organizações. Neste campo a pandemia acabou por ser um catalisador de uma mudança que num contexto normal iria demorar muito mais tempo a efetivar-se.

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