Desenvolver a capacitação dos colaboradores é cada vez mais uma estratégia alinhada com as políticas DEI e tem uma importância decisiva na incorporação dos valores e práticas ESG dentro das empresas. Em entrevista à Revista Sustentável, que partilho convosco, explico porque considero a aposta na aprendizagem e no desenvolvimento dos colaboradores extremamente relevante em resposta aos crescentes desafios da sustentabilidade.
Nas políticas e práticas de ESG, o S tem vindo a ganhar protagonismo nomeadamente no que diz respeito ao incentivo e compromisso com o desenvolvimento dos colaboradores. Como é abordada e que papel ocupa a formação dos colaboradores? É uma prioridade para as empresas?
A formação e o desenvolvimento de competências ocupam um lugar central na promoção de ambientes de trabalho mais equitativos, colaborativos, inclusivos e diversos. Ao investir no crescimento das pessoas, as empresas assumem um papel ativo na melhoria das condições de trabalho, na empregabilidade futura dos seus profissionais e na redução das desigualdades sociais, contribuindo para um ambiente corporativo mais sustentável.
Apostar em programas de desenvolvimento estruturados que garantam a atualização das competências técnicas, mas também o fortalecimento das competências interpessoais e comportamentais, num contexto de transformação permanente, onde as coisas mudam a uma velocidade nunca antes vista, é (ou deveria ser) uma prioridade estratégica para qualquer organização. Sobretudo quando sabemos que 50% dos conteúdos técnicos que nos são ensinados nas escolas e nas universidades ficam obsoletos ao fim de 4 anos, e que grande parte das tarefas que hoje realizamos, vão passar a ser, num futuro mais próximo do que podemos imaginar, assumidas por robots e/ou por inteligência artificial.
Se quisermos ter empresas resilientes, ágeis a reagir à mudança e devidamente preparadas para enfrentar o futuro, temos de criar ambientes que funcionem como habitats naturais de aprendizagem, onde a aquisição e transformação de competências é um processo contínuo e alinhado com a cultura organizacional. Investir em formação é uma estratégia inteligente que gera benefícios de longo prazo e tem de passar a ser um compromisso assumido por todos.
A formação não pode ser vista apenas como um benefício para motivar alguns ou ‘um capricho’ de outros que teimam em ‘pregar’ o valor acrescentado que a formação pode aportar à organização. A formação tem de estar enraizada na cultura organizacional e ser um pilar fundamental da estratégia empresarial.
“A formação não pode ser vista apenas como um benefício para motivar alguns ou ‘um capricho’ de outros que teimam em ‘pregar’ o valor acrescentado que a formação pode aportar à organização. A formação tem de estar enraizada na cultura organizacional e ser um pilar fundamental da estratégia empresarial.”
Formação é aprendizagem. É muito mais do que aquisição de conhecimento técnico. É cultura, é liderança, é bem-estar, inovação, transformação e um fator essencial para o engagement e retenção de talento. E é, na minha opinião, a chave para a transformação e sustentabilidade das pessoas e das organizações.
Assim como a responsabilidade social das empresas é assumida como o contributo das empresas para a comunidade, de que forma o compromisso dos empregadores com a formação dos colaboradores deve ser entendido como responsabilidade interna?
Os empregadores têm a responsabilidade de velar pela empregabilidade futura dos seus colaboradores.
É sabido que na próxima década cerca de 5% dos trabalhadores de todo o mundo (cerca de 400 milhões) vão mudar de funções e mais de 50% das profissões existentes vão desaparecer no futuro. Aliás, de acordo com o World Economic Fórum, em 2027, 23% dos empregos que conhecemos hoje vão ser diferentes. E neste contexto, estima-se que cerca de dois terços das competências técnicas consideradas atualmente relevantes ao exercício das nossas profissões vão mudar, pelo que pelo menos 70% dos nossos colaboradores terão de fazer algum tipo de formação para se manterem relevantes no mercado de trabalho. O desenvolvimento de competências dos colaboradores é uma responsabilidade dos empregadores com vista à manutenção da sustentabilidade do futuro do trabalho e da empregabilidade das pessoas no futuro.
E desenvolver competências é muito mais do que dar formação. A formação ocupa um lugar central, sem dúvida, mas a responsabilidade interna das empresas é muito mais vasta e passa por criar ambientes corporativos que fomentem a aprendizagem ao longo da vida e estimulem o desenvolvimento da singularidade de cada elemento das suas equipas, transformando-se numa learning organization que coloca à disposição dos seus colaboradores dispositivos, plataformas, conteúdos e meios para desenvolveram novos conhecimentos, novas formas de estar, de agir e de contribuir para a transformação da sua organização e apoiar a transição para a sustentabilidade.
De que forma é que a formação é pilar para ações concretas que acompanham a transição para a sustentabilidade? Onde estão as maiores dificuldades para que assim seja, quer da parte da empresa quer da parte dos colaboradores?
A formação é um pilar da transição para a sustentabilidade quando é aplicada de forma prática no dia-a-dia. Sem capacitação, os compromissos ESG permanecem apenas no papel. A aprendizagem contínua leva as equipas a compreender e saber aplicar as melhores práticas e a conseguir medir o impacto das suas ações. (…) sensibilizando-os para o que significa a sustentabilidade e qual a necessidade de adotarem práticas sustentáveis no dia-a-dia para conseguirem fazer uma gestão mais eficiente de recursos. (…) mitigar riscos e melhorar a conformidade legal, capacitando as equipas para atuar em conformidade com as novas regras (…)
A transição para um modelo sustentável requer novas competências e novos perfis, nem sempre disponíveis no mercado. A formação é uma excelente oportunidade para desenvolver o talento interno, dando, por um lado, a oportunidade de progressão lateral na carreira a muitos profissionais apaixonados pelos desafios da sustentabilidade e, por outro, contribuindo para fazer face à escassez de perfis com competências nesta área (…).
“O desenvolvimento de competências dos colaboradores é uma responsabilidade dos empregadores com vista à manutenção da sustentabilidade do futuro do trabalho e da empregabilidade das pessoas no futuro”
Em relação às dificuldades para que a formação seja um pilar da transição para a sustentabilidade, do lado dos colaboradores, a dificuldade em conectar o que aprendem com as suas funções diárias e o facto de sentirem que a sustentabilidade é algo distante da sua função ou sem impacto direto no seu trabalho, (…). Do lado das empresas, a dificuldade em identificar quais são as competências mais críticas a desenvolver e a morosidade na adaptação dos processos internos (…) são as dificuldades que considero mais críticas.
Entrevista publicada na revista Sustentável de janeiro_fevereiro_2025.
Lei na íntegra em: www.revistasustentável.pt