Os tempos não têm sido fáceis para as empresas em Portugal. Por todo o lado se houve falar em despedimentos, cortes, reduções. Como é óbvio um cenário destes teria que alterar a forma como as empresas hoje contratam. Sim porque ainda há quem o faça e muito. Agora as regras do jogo mudaram. Particularmente a exigência aumentou. “O contexto atual é extremamente exigente e agressivo em termos económicos e afeta naturalmente o que é o recrutamento e seleção” afirma Vanda Brito, search & selection manager da Kelly Services. “Continuando a ser uma das componentes vitais da vida das empresas, é atualmente encarado numa perspetiva ainda mais exigente e com uma noção muito clara do retorno financeiro e de novas oportunidades de negócio que daí advém. O que está a mudar é que as empresas vêm cada vez mais no recrutamento uma oportunidade para o desenvolvimento, para a criatividade e para se reinventarem de maneira a corresponderem às exigências de qualquer mercado. Isto tem obviamente implicações nas decisões de quem recruta e um impacto imediato em quem é recrutado. Atualmente os candidatos são muito mais do que apenas alguém que responde a um anúncio. Pressupõe-se que as pessoas ativamente se proponham, sugiram e mostrem os reais benefícios e potencialidades da sua contratação”, explica a responsável da Kelly Services.
“Existe uma larga oferta de candidatos com experiência profissional acima dos 10 anos, que neste momento estão disponíveis para dar um passo atrás em termos de carreira, ou procurar outras geografias”, Alexandra Andrade, diretora-geral da Msearch
Referindo também o impacto da crise nesta área, Alexandra Andrade, diretora-geral da Msearch refere que “fruto inevitável do atual contexto económico, o mercado de trabalho sofre também grandes alterações, tornando-se pouco previsível. Não se encontrando o recrutamento congelado, sentimos uma alteração profunda no tipo de perfis procurados, já que existe uma maior tendência para o recrutamento de cargos médios com menor experiência que anteriormente, bem como a procura de bons profissionais técnicos para novas latitudes”. Alexandra Andrade continua afirmando que “existe uma larga oferta de candidatos com experiência profissional acima dos 10 anos, que neste momento estão disponíveis para dar um passo atrás em termos de carreira, ou procurar outras geografias. No mercado também se encontram candidatos que estão empregados mas que sentem maior insegurança para mudar de projeto. Todas estas mudanças têm tido impacto no panorama atual do recrutamento em Portugal”. Já Patrícia Pita, gestora de clientes da RH Mais refere a questão da otimização de recursos. “As mudanças existentes ao nível do Recrutamento em Portugal prendem-se com a adaptação das empresas à conjuntura atual e às necessidades e condições do mercado em que atuam. Neste sentido, e devido a uma forte diminuição do volume de vendas das empresas, estas procuram reorganizar e otimizar os seus recursos internos por forma a conseguirem manter os níveis de qualidade e eficiência dos serviços, reduzindo o número de postos de trabalho e, consequentemente, os custos salariais. Ao nível do recrutamento, tem-se vindo a assistir uma forte diminuição no número de oportunidades profissionais disponíveis e também a um grande volume de respostas de candidatos para as poucas ofertas disponibilizadas”.
E na Distribuição?
As mudanças são grandes e óbvias em termos gerais no tecido empresarial português. Mas e em concreto na área da Distribuição? “Para fazer face às exigências dos desafios atuais, mais do que candidatos com excelentes qualificações e experiência profissional comprovada, nunca como agora as soft skills assumiram um papel tão determinante na seleção. O equilíbrio entre todas estas forças para um setor tão dinâmico como o da distribuição moderna é a chave do sucesso”, garante Vanda Brito. Mais aprofundadamente, a diretora-geral da Msearch reforça que “os dois últimos anos foram marcados pela viragem no mercado de retalho nacional, determinado por uma nova conjuntura económica com um mercado maduro. Necessariamente as equipas têm de ser ajustadas às novas políticas e exigências da marca. O consumidor é mais exigente, e as equipas comerciais têm de ter um perfil adequado à realidade e proporcionar uma experiência/venda diferenciadora, para garantir a fidelização do cliente”. Alexandra Andrade explica ainda que “dado a estagnação económica no mercado português, a Msearch tem recrutado vários perfis na área da distribuição para geografias como Angola, onde este mercado está em grande crescimento. Desenvolvemos recentemente processos para uma empresa de raiz, desde quadros intermédios, a quadros médios e superiores. É interessante verificar esta tendência no mercado angolano”.
“Para fazer face às exigências dos desafios atuais, mais do que candidatos com excelentes qualificações e experiência profissional comprovada, nunca como agora as soft skills assumiram um papel tão determinante na seleção. O equilíbrio entre todas estas forças para um setor tão dinâmico como o da distribuição moderna é a chave do sucesso”, Vanda Brito search & selection manager da Kelly Services
A diversificação como tendência internacional
Como sabemos a crise não é exclusiva de Portugal. E como tal as mudanças têm acontecido um pouco por todo o mundo. Muito debatido na imprensa internacional, o recrutamento tem sido alvo de grande escrutínio pela imprensa internacional e métodos antigos começam agora a ser debatidos e mesmo questionados. É o caso da cultura da empresa face à cultura do funcionário, ou, se preferir, da aposta, ou não, na diversificação. A search&selection manager da Kelly Services comenta que “entendemos que em qualquer situação há linhas orientadoras da cultura de uma empresa que devem ser seguidas pelos seus colaboradores. Contudo, esta questão leva realmente a um debate curioso acerca das diferenças e do impacto que estas diferenças podem significar para a empresa”. Para a consultora, “em concreto, no sector da Grande Distribuição que é naturalmente dinâmico, competitivo e relativamente aberto, a experiência diz-nos que algumas diferenças culturais tendem a ter um impacto positivo numa contratação pela inovação e pelo dinamismo que daí possa advir. No entanto, importante é o facto de que existam fatores de flexibilidade intrínsecos à própria pessoa que lhe permitam a adaptação aos traços incontornáveis da cultura de uma empresa. É esta relação entre a cultura da empresa e o que a pessoa pode trazer de novo a esta cultura que torna interessante uma contratação inesperada”. Alexandra Andrade recorda que “as empresas, também em função da sua cultura, variam nos seus requisitos. Uma mais conservadora irá procurar candidatos com um perfil cultural semelhante. No entanto, empresas mais inovadoras, ou seja diferenciadoras, procuram candidatos contrastantes para que o ADN da empresa fique mais rico”.
Tendo em conta tudo isto a diversificação compensa? “A diversificação pode, de facto, trazer novas oportunidades. O facto de as empresas estarem disponíveis para integrar novos profissionais, que vêm de realidades diferentes, com percursos profissionais distintos, poderá permitir-lhes aceder a novas formas de pensar e questionar a sua própria organização interna, os seus procedimentos e desenvolver processos e procedimentos mais eficientes para a sua área de negócio. De facto, lembrando a frase “é na crise que surgem as grandes oportunidades”, o pensar outside the box poderá ser uma excelente oportunidade. No entanto, as organizações têm que ser recetivas e abertas a novas ideias e estar dispostas a assumir riscos” afirma Patrícia Pita. Já Vanda Brito realça que “será importante perceber as posições em questão, o risco e os objetivos pretendidos para determinada função. Mais uma vez, há questões incontornáveis numa cultura organizacional que devem fazer parte desta equação. No entanto, diferentes experiências e posturas podem definitivamente contribuir para a inovação e diversificação nos negócios”. Para a diretora-geral da Msearch “é verdade que os gestores frequentemente procuram colaboradores que partilhem alguns dos valores da empresa. É algo natural do ser humano criar empatia e ganhar confiança no seu semelhante.
No entanto, é igualmente verdade que as ideias novas e diferentes podem contribuir para responder a desafios. Principalmente em contextos económicos menos desfavoráveis, as ideias inovadoras e out of the box podem fazer a diferença porque, se todos os elementos de uma equipa estiverem de acordo com tudo, então a base de trabalho e as suas decisões serão sempre as mesmas, mantendo por isso as estratégias de sempre”. Alexandra Andrade dá um exemplo disto mendo referindo os “profissionais de marketing, brand managers de empresas de FMCG (Fast Moving Consumer Goods), que são muito procurados pelas multinacionais de outros sectores. Mesmo assim, acredito que essa questão depende muito do contexto em que o negócio se insere. O mais importante é o candidato identificar-se com os valores ou cultura da empresa para haver uma a inserção rápida do colaborador no dia-a-dia da empresa, pois só assim conseguirá dar as respostas necessárias, no timing exigido pelo próprio negócio”.
“As mudanças existentes ao nível do Recrutamento em Portugal prendem-se com a adaptação das empresas à conjuntura atual e às necessidades e condições do mercado em que atuam.”, Patrícia Pita, Gestora de clientes da RH Mais
Como recrutar?
Perante tantas especificidades e mudanças coloca-se a questão? Quem deve recrutar? Internamente na empresa? O CEO? Os recursos humanos? Contratar uma empresa de recrutamento? “Em funções críticas e estratégicas o CEO continua e deve continuar a dar um input extremamente importante num processo de recrutamento. Não podemos esquecer que o CEO define e constrói estratégias para a sua organização e como tal sabe quais as suas necessidades” garante a search&selection manager da Kelly Services. “No entanto, o contributo de uma empresa externa pode ser determinante para o sucesso de um recrutamento. As empresas de recrutamento conhecem e trabalham diariamente todos os sectores do mercado. A nossa atuação transversal no mercado permite-nos conhecer as mudanças, as estratégias, as pessoas de sucesso e com potencial. Podemos dar concretamente um contributo importantíssimo e imparcial num processo de recrutamento. A nossa experiência diz-nos que o nosso sucesso deriva do envolvimento que fazemos dos nossos clientes nos processos de recrutamento que desenvolvemos. É a conjugação destes dois mundos e o encarar esta experiência em equipa que reflete uma resposta assertiva e direta às necessidades dos nossos clientes” acrescenta Vanda Brito.
Opinião semelhante tem Alexandra Andrade. “Numa primeira fase julgo que a imparcialidade da consultora de RH é fulcral para o processo de seleção. Trabalhando com vários clientes e vários sectores de atividade, a consultora de RH tem a noção concreta do tipo de características que o mercado oferece e pode, a partir dessa informação, identificar aquele que mais se adequa às necessidades da empresa. O objetivo será sempre o cruzamento perfeito entre o candidato e a empresa analisando as competências técnicas mas também as comportamentais”. Mas o CEO terá algo a dizer. “No entanto, e numa segunda fase, quando falamos de quadros médios superiores, é de todo o interesse que o CEO seja envolvido no processo conhecendo os candidatos pré-seleccionados, podendo dessa forma estar envolvido na decisão final”. A gestora de clientes da RH Mais segue a mesma linha de pensamento. “Na nossa opinião, os responsáveis da empresa ou as chefias diretas devem estar envolvidas nos processos de seleção pois possuem um profundo conhecimento da empresa, da sua cultura organizacional, das competências específicas que procuram nos candidatos a integrar, e até mesmo na validação da adaptabilidade dos candidatos ao modelo organizacional e estruturas existentes”. Patrícia Pita concluir que “no entanto, os processos de recrutamento devem ser sempre conduzidos por profissionais de recursos humanos, que têm a capacidade e a formação para avaliar outros aspetos que são fundamentais para a adaptabilidade do candidato à empresa: fatores pessoais, motivacionais, e de atitude são fatores de extrema relevância para o sucesso de um processo de recrutamento, e que são avaliados de forma isenta por um profissional de recursos humanos. Para além disso, tornam mais céleres os processos e permitem que os responsáveis da empresa participem na seleção dos candidatos, e que não despendam tempo precioso a avaliar candidatos não aconselháveis”.
Texto | Fredy Vinagre